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PLURAL: os textos de Suelen Aires Gonçalves e Silvana Maldaner

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Legítima Defesa Imaginária 

Suelen Aires Gonçalves
Socióloga e professora universitária


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Oinício da semana chegou com um sentimento de injustiça no ar. Nos causa indignação o resultado final do inquérito da Polícia Civil que apurou a morte de Gustavo do Amaral, na cidade de Marau, no norte do Estado, em uma ação da Polícia Militar. A intervenção, que teve a morte como desfecho, deu-se por parte da polícia militar, que estava em busca de um veículo roubado e confundiu o veículo da vítima com o veículo perseguido. Houve uma colisão do veículo roubado com o veículo onde estava Gustavo e sua equipe de trabalho. Infelizmente, Gustavo foi atingido e morto no local. O delegado responsável pela investigação, Norberto Rodrigues, concluiu, no início da semana, que o Policial Militar (PM) agiu em legítima defesa imaginária, conhecida, juridicamente, como putativa, ou seja, que pressupõe uma ameaça ao atirador. Em tese, o assassinato foi considerado um erro do PM, não um crime passível de punição.

Logo após o fato, inicia-se um processo de investigação por parte da Brigada Militar e da Policia Civil,com versões distintas entre as corporações. Segundo informações apresentadas pela imprensa local, a Corregedoria-Geral da Brigada Militar (BM) optou por indiciar o soldado da corporação que atirou contra Gustavo Amaral. A instituição relata que identificou indício de crime militar que resultou em um homicídio. Então, a corporação da Polícia Militar vê indícios de crime e diverge da Polícia Civil, que identificou "legítima defesa imaginária" no inquérito policial encerrado nas últimas horas. Acidentes acontecem, mas não é o caso. Estamos diante de uma circunstância nítida de racismo estrutural, manifestado nas instituições de segurança pública que agiu com seletividade e ceifou a vida de mais um jovem negro.

Racismo reproduzido nas instituições

Os desdobramentos do caso causam maiores reflexões sobre o papel das instituições na construção de espaços onde o racismo é reproduzido. Neste sentido, a família de Gustavo Amaral e organizações dos movimentos negros e populares buscam recorrer da contra a conclusão do inquérito. Inúmeras questões necessitam ficar nítidas. Como, por exemplo: as testemunhas elencadas foram apenas os militares da corporação. Ou seja, necessitamos ouvir as demais testemunhas (colegas da vítima) que estavam no local do crime. Houve avaliação correta do risco? O uso da arma de fogo foi realizado conforme protocolos? Por que atiraram na vítima mesmo com sua identificação feita ao PM? São perguntas ainda sem respostas.

Vidas negras importam

Exigimos dos órgãos responsáveis respostas plausíveis sobre as questões, exigimos que o Governador do Estado do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), que responde pelas forças policias do Estado, receba a família do jovem negro morto na abordagem policial. Tal encontro foi requisitado formalmente, por familiares e por entidades que representam a defesa dos direitos humanos no estado do Rio Grande do Sul. Que seja revertida a justificativa infundada de "legítima defesa imaginária" imediatamente. Tal justificativa configura-se, em última análise, como legitimidade para matar de uma polícia despreparada para viver em democracia. Me solidarizo com a dor dos familiares de Gustavo Amaral e somamos na luta por justiça com os demais cidadãos e cidadãs. Existe um caminho após o inquérito policial e exigimos justiça para Gustavo Amaral, bem como para casos de inúmeros homens negros e mulheres negras que, no Brasil, têm suas vidas ceifadas pelo estado genocida. Vidas negras importam!

Dr. Mariano da Rocha

Silvana Maldaner
Editora de revista


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Algumas pessoas são visionárias e vivem muito à frente de seu tempo. Conseguem ver o futuro acima da média e não se deixam levar pelas grandes e inúmeras dificuldades e boicotes de seus planos.

Dr. Mariano da Rocha foi o homem do século. Um médico que construiu um legado, não apenas para a comunidade universitária, para a cidade e para a região, mas deixou uma marca no país. Ele idealizou uma universidade pública, a primeira do interior do Brasil, no século passado, quando a vida parecia andar lentamente, os processos não eram digitalizados, não existia internet e os encontros eram presenciais .

Viajava a Brasília com sua pasta de projetos, encaminhava aos deputados, marcava reuniões, visitava assessores e ligava inúmeras vezes ao próprio Juscelino Kubitschek. Foi ignorado por alguns e considerado louco por outros.

Com sua persistência, audácia e fé inabalável de que a educação transforma, trouxe as melhores tecnologias da Europa para os inúmeros laboratórios, fez convênios de intercâmbios com as principais universidades do mundo. Na área da saúde, foi pioneiro em muitas áreas, trazendo cirurgiões com técnicas avançadas. Santa Maria estava colocada no patamar de primeiro mundo. No Hospital Universitário, foi realizada a primeira cirurgia cardíaca do interior do Estado. Até o Dr. Zerbini, o primeiro cirurgião cardíaco a fazer transplante de coração da América Latina, esteve em Santa Maria. Aqui, a saúde sempre foi referência para um universo de mais de 2 milhões de pessoas. Ambulâncias de todo Estado chegavam para buscar a esperança da cura e do tratamento. Até hoje é assim.

Quantas descobertas, quanto conhecimento. Partidas dolorosas e chegadas calorosas. Vidas transformadas. Acolhimento. Pessoas do mundo todo vindo estudar aqui. A pluralidade cultural. A diversidade étnica.

Fico imaginando qual será o grande visionário deste século? Quem será capaz de construir, edificar, agregar, realizar grandes projetos para beneficiar uma comunidade inteira? Teremos um líder que não esteja preocupado com status de poder e ostentação e, sim, com algo altruísta, superior a interesses econômicos e políticos?

A educação e a economia

Hoje, 60 anos após sua fundação, a UFSM continua sendo a principal fonte de circulação de dinheiro na cidade, não só porque seu orçamento é mais que o dobro da prefeitura, mas por todo o universo paralelo que envolve. Os 35 mil estudantes, que agora estão em casa, também impactam diretamente na economia da cidade. Transporte coletivo, restaurantes, mercados, comércio, prestadores de serviço e bares tiveram uma queda de quase 70% no consumo. A economia local está fragilizada pela ausência destes milhares de jovens que oxigenam e movimentam nossa cidade.

Uma solução digna

Se considerarmos todos os estudantes da cidade, envolvendo as demais instituições de Ensino Superior e os ensinos Médio e Fundamental, temos um universo de mais de 80 mil estudantes na cidade.

Nossa cidade com vocação em educação, agora, está parada. As aulas estão suspensas e há rumores de que não retornam em 2020 no modelo presencial.

Os professores e alunos, principalmente do Ensino Fundamental, não estavam preparados para tamanha exigência. Tampouco as quase 37 mil crianças das escolas públicas dispõem de computadores e acesso à internet de qualidade, bem como um plano de aulas virtuais.

Rogo a Deus, e ao saudoso Dr. Mariano da Rocha, que deveria ser o padroeiro da educação em nossa cidade, que em breve tenhamos uma solução digna de uma cidade que teve um passado de glória e honra, precursora, audaciosa e destemida em desenvolver, crescer e prosperar.

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